Artigo - "No princípio era o mythos: articulações entre Mito, Psicanálise e Linguagem"

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Autores: Ana Amália Torres Souza (UFRN) e Zeferino Jesus Barbosa Rocha (UNICAP) Texto publicado em: Estudos de Psicologia, 14 (3), 2009, p. 199-206.
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Artigo - "No princípio era o mythos: articulações entre Mito, Psicanálise e Linguagem"
  1. Apresenta algumas das principais concepções de mito, surgidas no decurso da História do Pensamento, seguindo o roteiro proposto pelo italiano Nicola Abbagnano, em seu Dicionário de Filosofia (1961)
    1. Primeira concepção: na Antiguidade Clássica, o Mythos opunha-se ao Lógos (lógica), à Razão e ao discurso filosófico, de natureza racional, o qual era tido como verdadeiro, e, como tal, contraposto às narrativas míticas. Todavia, a filosofia penetrava no campo do mito ao estudar questões humanas, como a origem do mundo. O discurso filosófico então racionalizou e laicizou a narrativa mítica, procurando superá-la e deixando-a como coisa de um passado primitivo. O mito deixa de ser a explicação para o cotidiano e o cotidiano passa a explicar as construções míticas. Uma tempestade deixava de ser vista como um acesso de fúria dos deuses e passava a ser vista como um fenômeno natural.
      1. Assim, o surgimento da filosofia, na Grécia Antiga, marca, de acordo com alguns estudiosos, o declínio do pensamento mítico. Há autores que discordam de tal lógica tão direta, como Walter Burkert (1991), o qual defende que a filosofia jamais se emancipara do mito completamente.
        1. Substitui-se, (ponto onde o texto se equivoca ao não considerar os distintos ritmos em que tal transformação se dá), a linguagem mítica, toma-se distância de uma Mitopoiése (criação de mitos) e insere-se na linguagem do discurso filosófico.
        2. Segunda concepção: o mito é situado em um plano diferente da lógica científica, mas é dotado de igual valor por ser "uma forma autônoma de pensamento ou de vida" (ABBAGNANO, 2000, p. 673), possuindo uma lógica própria, o que pode ser associado a uma forma singular de "fazer" filosófico.
          1. O Romantismo foi uma das vertentes teóricas que adotaram tal perspectiva, bem como alguns filósofos e sociólogos, como Ernst Cassirer e Gilbert Durand.
            1. Para Cassirer, partindo de pressupostos hegelianos, o mito teria uma realidade peculiar para a consciência, sendo uma forma de vida característica e original, na linha limítrofe entre o objetivo e o subjetivo, uma esfera indiferenciada entre ambos. Um patrimônio espiritual da humanidade cuja unidade deve ser explicada pela unidade da alma humana (CASSIRER, 1964/1998), intimamente ligado à linguagem.
              1. Assim, os mitos resultariam de experiências humanas coletivas, sem que seus produtores tivessem consciência de sua autoria, pois são projeções das interpretações do mundo interior e das impressões do mundo exterior, transformadas em imagens que não se resumem a metáforas ou representações, mas são expressões da própria realidade. Por isso, "não podemos reduzir o mito a certos elementos estáticos fixos, mas procurar apreendê-lo em sua vida interior, em sua mobilidade e versatilidade, em seu princípio dinâmico." (CASSIRER, 1944,1972a, p. 127)
              2. Durand, em seus livros Imaginação simbólica (1988) e As estruturas antropológicas do imaginário (1997). defende que "o que importa no mito não é exclusivamente o encadeamento da narrativa, mas também o sentido simbólico dos termos" (DURAND, 1997, p. 356), e acrescenta que o mito tem a mesma estrutura da música, com um ritmo próprio e com a função não de contar, mas de repetir como o refrão de uma canção.
            2. Terceira concepção: fundamenta-se na moderna teoria sociológica, tendo Fraser e Malinowski como precursores. Para estes, o mito tem a função única de dar continuidade à cultura, estando intimamente ligada à natureza da tradição, à atitude humana em relação ao passado. Assim, o mito não está ligado só às sociedades primevas, mas é indispensável a qualquer cultura, sendo necessário "estudá-lo em relação à função que exerce na sociedade humana" (ABBAGNANO, 2000, p. 675)
              1. Esta tendência não se opõe à segunda concepção, mas focaliza aspectos diferentes do mito
                1. Dentre os autores que se dedicaram a tal proposta, Lévi-Strauss defendera que cada grupo social expressa, em suas construções míticas, suas atitudes em relação ao mundo, bem como as maneiras de resolver os problemas da existência. Assim, o mito não se sujeita a "nenhuma regra de lógica ou de continuidade" (LÉVI-STRAUSS, 1973/1996, p. 239) e é considerado como tal enquanto for assim percebido e reconhecido. Os "mitemas", termos por este criado, refere-se a uma repetição de sequências do mito. Além disso, os mitos possuem dimensão sincrônica e diacrônica.
                  1. Destacam-se ainda os estudos de Edgar Morin (1986). Este distingue dois modos de conhecimento e de ação: o simbólico/mitológico/mágico e o empírico/técnico/racional. Para ele, existem complementaridade e possibilidade de coexistência e interação entre esses modelos, pois "toda a renúncia ao conhecimento empírico/técnico/racional conduziria os humanos à morte e toda a renúncia às suas crenças fundamentais desintegraria a sua sociedade" (MORIN, 1986, p. 144).
                    1. Para Morin, o mito é inseparável da linguagem. O mito também não se trata de uma mentira, pois é verdadeiro para quem vive e é uma forma espontânea do homem situar-se no mundo, elevá-lo a outra esfera, ao transcendente, oferecendo valores absolutos e paradigmas às atividades humanas (MORIN, 1986, p. 150)
                    2. Mircea Eliade (1963/2000) constata que "o mito é uma realidade cultural complexa, que pode ser abordada e interpretada em perspectivas múltiplas e complementares ... Conta uma história sagrada, relata um acontecimento que teve lugar no tempo primordial, o tempo fabuloso dos 'começos'" (p. 12). O tempo do mito é o tempo fabuloso, o tempo passado, mas sempre presente, indissociável do nosso tempo.
                      1. O foco do mito seriam a origem das coisas. Mesmo os mitos escatológicos dirigiam sua atenção não ao fim em si, mas para um novo começo. Sendo assim, a relação da Psicanálise com a mitologia está no fato de ambos se interessarem pelas origens e pelos primórdios do humano.
                    3. O mito tem valor significante, pois é "alguma coisa que, em si, não significa nada, mas carrega, certamente, toda a ordem de significação" (LACAN, 1956-1957/1995, p. 261). O mito exige interpretação e constante ressignificação, a partir dos elementos que lhes compõe, permitindo que o sentido possa ser outro. Como estrutura simbólica, o mito permite vestir o real com o imaginário (CARREIRA, 2001).
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